"Morto querido não pára de morrer dentro de nós"
Parir, sair, saudosar, despedir e nascer são vizinhas palavras que andam a sibilar no caminho. Na deriva do tempo elas passeiam na veia, ancestralidade convidando ao mais anitgo de mim. Essa tristeza macia só poderia ser um presente dele. Demorei, mas percebi. Faz um ano que ele partiu. Gosto quando desentendo esta cronologia, é um encanto que me toma. É vivo demais ser surpreendida pelas palavras de um susto, de um surto, de uma memória, porque agora não entender os tempos e gerações é uma aposta generosa no amor tecido e alinhavado na diferença, cravada no corpo. Desinstitucionalizo a família, nesta saudade o lastro é afeto ressoando em carne.
Sentir saudade do pai hoje é palavrear sem tagarelice, um jeito de permanecê-lo em mim enquanto viajo e quando retorno percebo que ele está em minha face, que eu sou ele de um outro jeito. Há quem diga, que ele mora no furaco de meu queixo. E não deve ser inverdade, porque sempre que a ele me refiro, é no queixo que pouso a mão, como se o acarinhasse.
Nas últimas des-horas ele se-ria em gravidade de morrer, com um ritmo des-pedinte, em agonia de viver desejava o solo, jogava o corpo chão adentro e no tombar da tarde do último dia de junho de 2007 sua morte me alcança sem disfarces. Dizem os especialistas que foi ele foi vítima de câncer, excesso de cigarro e que o fígado pifou. E eu acho é que foi de insuficiência de vida mesmo.
As vezes viver é perecível e cheio de incômodos, é como ter sono e não poder dormir e ele repousou em sono largo, de resto de vida inteira. Sua morte me rasgou em amparo partido, jamais em abandono.
Nunca acreditei no rito fúnebre que assisti, talvez porque a vida seja muito larga para caber em qualquer cova. Acompanhei esta passagem como se forá o plantio da árvore paterna e ainda invento encontros com as tuas folhas, corpo/ caule em minhas lembranças, habitantes da minha vontade de estar junto.
Diariamente, como que desanunciada da tua ausência caio no jardim do mundo, encontrando suas sementes, seu ritmo, as bicicletas dos teus delírios, tudo que amávamos e não des-fizemos juntos. Por vezes no saltar do sol um som se inventa na minha escuta - seu andar manco? não, quem faz morada e recria jardins mesmo é a saudade, com ida sem vinda.
Ando me e-mudando de e em mim mesma, que também sou ele em vida. Um aprender a habitar o mundo em sua ausência. Hoje já não é mais falta, um ano é pouco. Ando descobrindo que tempo é solo fértil, que recria presenças em mim.
Nunca gostei da palavra Obrigada, fala de uma responsabilidade de agradecimento ao gesto cordial, mas aqui sem licença poética, ouso um uso, afastado dos protocolos e abrigado no desejo: obrigada por ser assim, tão pai meu!
3 comentários:
monte
vi
deu
buenos
aires
bjus p vc
Bel.
Saudade de ter o que na verdade temos, mas não temos, pois o amor não morre e então como dizer que morreu?
Bjs com carinho
Marilyn
Oi querida, queria uma conversa contigo em qualquer lugar, com alguma boa bebida e as boas palavras que voce sempre soube me dizer. Saudade é eufemismo...
Paula.
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